Aplicabilidade da multa do art. 475-J do CPC no Processo do Trabalho


O presente tem como objetivo fazer uma breve análise de dois acórdãos acerca do tema “aplicação da multa do artigo 475-J do CPC no Processo do Trabalho”, demonstrando nesses dois posicionamentos a aplicabilidade, no âmbito do processo do trabalho, da referida multa. Foram utilizados, para embasar tais comentários, a Constituição Federal, a Consolidação das Leis do Trabalho e o Código de Processo Civil.


EMENTA: MULTA PREVISTA NO ART. 475-J DO CPC. APLICABILIDADE NO PROCESSO DO TRABALHO. As disposições do CPC são aplicáveis ao Processo do Trabalho, de forma subsidiária, quando omissa a legislação trabalhista. Não havendo a cominação de multa, na CLT, pelo não-cumprimento espontâneo da sentença, aplicável a previsão do art. 475-J do CPC. Acórdão do processo 00096-2001-029-04-00-5 (AP) Redator: MARIO CHAVES Data: 23/01/2008 Origem: 29ª Vara do Trabalho de Porto Alegre

EMENTA: AGRAVO DE PETIÇÃO DO EXECUTADO MULTA PREVISTA NO ART. 475-J DO CPC. Não se aplica à execução trabalhista a multa prevista no art. 475-J do CPC, por ser incompatível com norma expressa do processo do trabalho (art. 880 da CLT), que determina o pagamento em 48 horas ou a garantia da execução, sob pena de penhora, não de multa. Agravo não provido. Acórdão do processo 00221-1997-732-04-00-0 (AP) Redator: CLEUSA REGINA HALFEN Data: 26/06/2008 Origem: 2ª Vara do Trabalho de Santa Cruz do Sul

A despeito do tema, podemos dividi-lo em duas correntes de pensamentos. A primeira defende a plena aplicação do instituto ao processo do trabalho. A segunda nega a aplicação do dispositivo ao processo do trabalho. Poderia haver, ainda, uma terceira corrente, a que defende a aplicação apenas da multa de 10%, sendo, contudo, mantido o prazo de 48 horas. Em relação a esta última, faz-se necessário um amplo estudo, que poderá vir a ser tema futuro. Restringiremos o estudo às duas primeiras correntes.

Em análise à primeira corrente, temos:

As disposições do Código de Processo Civil são aplicáveis ao Processo do Trabalho, de forma subsidiária, quando omissa a legislação trabalhista e desde que seja compatível[1]. A Consolidação das Leis do Trabalho não comina qualquer multa pelo não-cumprimento espontâneo da sentença, assim, entende-se plenamente aplicável a previsão do art. 475-J[2] do CPC.

A previsão do artigo 475-J do CPC veio a tornar mais célere a execução, de modo a satisfazer o credor. Tal previsão está de acordo com os princípios que regem o direito processual trabalhista. Ainda, a aplicação do referido dispositivo está em consonância com o art. 5°, LXXVII da Constituição Federal[3].

Em defesa da aplicabilidade do artigo 475-J do CPC, deve-se mencionar o princípio da proteção, que diz ser necessário a aplicação da norma mais favorável, a aplicação da condição mais benéfica, e interpretação da norma, no caso concreto, de modo favorável ao trabalhador (in dubio pro operario).

A interpretação dos preceitos legais, inclusive relativos ao processo, deve ser feita com base nos princípios constitucionais que proclamam e consagram direitos fundamentais, de modo que as normas ou teorias deverão ser aplicadas sempre que condizentes com os princípios que justificam sua existência.

Na seara do direito do trabalho, o princípio da proteção é expressão desse caráter instrumental. Incide também sobre o processo do trabalho e determina a aplicação da norma mais favorável ao credor trabalhista, que, normalmente, é o trabalhador.

Segunda corrente:

Considerando que a CLT tem dispositivo que disciplina a citação para pagamento, a aplicação subsidiária se daria apenas em caso de omissão, conforme artigos 769 e 889[4] da CLT. Destarte, não há que se falar em aplicação subsidiária quando existe norma específica, sob pena de descaracterizar o processo do trabalho. A fonte subsidiária, para o processo de execução trabalhista, é, pois, a Lei de Execução Fiscal.

O artigo 882[5] da CLT confere, expressamente, a possibilidade de oferecer bem à penhora, nada referindo a propósito da multa. Para a aplicação do art. 475-J no processo trabalhista, é necessária regulamentação expressa para a matéria.

Apesar da intenção ao aplicar a multa do dispositivo civil ser um estímulo ao adimplemento da dívida, evitando a mora do devedor, a referida aplicação restaria obstada pelo conteúdo do artigo 880[6] da CLT.

Em síntese, não há lacuna no artigo 880 da CLT, e caso houvesse, seriam aplicáveis primeiramente as disposições da lei de execução fiscal na execução trabalhista. Além disso, é inafastável a incompatibilidade do instituto com o processo do trabalho. Na liquidação de sentença trabalhista os atos de acertamento estão entremeados com os de constrição. Basta atentar que somente após a garantia do juízo (penhora) é possível impugnar a sentença de liquidação. Assim, antes da citação, por óbvio, jamais se terá “quantia fixada em liquidação”.

Os argumentos contrários à aplicação da multa no processo do trabalho têm fundamento em uma só premissa: a de que a CLT não seria omissa quanto ao rito da execução trabalhista. A verdade, porém, é que não se está a cuidar de medida sub-rogatória, mas sim de meio coercitivo que sequer precisa estar previsto com especificidade. Assim, uma vez que ausentes no regramento processual trabalhista medidas coercitivas, a multa do artigo 475-J é aceita para assegurar a efetividade.



[1]CLT Art. 769 - Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.

[2] CPC Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.

[3]CF Art. 5°, LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

[4] CLT Art. 889 - Aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal.

[5] CLT Art. 882 - O executado que não pagar a importância reclamada poderá garantir a execução mediante depósito da mesma, atualizada e acrescida das despesas processuais, ou nomeando bens à penhora, observada a ordem preferencial estabelecida no art. 655 do Código Processual Civil.

[6] CLT Art. 880. Requerida a execução, o juiz ou presidente do tribunal mandará expedir mandado de citação do executado, a fim de que cumpra a decisão ou o acordo no prazo, pelo modo e sob as cominações estabelecidas ou, quando se tratar de pagamento em dinheiro, inclusive de contribuições sociais devidas à União, para que o faça em 48 (quarenta e oito) horas ou garanta a execução, sob pena de penhora.

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